A Guerra do Paraguai, inicialmente vista como exemplo de imperialismo britânico, teve sua interpretação revisada por historiadores.
A Guerra do Paraguai, um dos conflitos mais significativos da história da América Latina, foi por muito tempo ensinada de maneira equivocada aos alunos brasileiros. Essa guerra, que ocorreu de 1864 e 1870, foi uma das mais sangrentas já registradas no continente americano. Durante anos, muitos historiadores e professores de história ensinaram uma versão particularmente sensacionalista da guerra.
Essa versão, popularizada pelas oposições ao regime militar, retratava a Guerra do Paraguai como o maior e mais sangrento conflito armado internacional da América Latina. O conflito foi marcado por combates brutais e pela destruição de cidades inteiras. O derramamento de sangue foi muito grande, e a guerra deixou um legado sombrio na região. Nesse contexto, a Guerra do Paraguai foi um ponto de inflexão na história da região, marcando um período de conflitos armados que afetaram o continente por décadas.
Imperativos de uma narrativa
Com foco em uma aborrecedora aversão ao imperialismo estrangeiro e qualquer empecilho das grandes potências nos destinos sul-americanos, vendia-se a narrativa de que o conflito armado do século 19 fora causado, financiado e indiretamente capitaneado pela Grã-Bretanha. Nessa história, o Paraguai ascendia como um país que caminhava para ser considerado desenvolvido, com industrialização, justiça social e uma produção de riquezas sem igual, de forma independente, configurando assim uma exceção naquele contexto de novos países americanos que estavam conseguindo autonomia frente aos colonizadores a preço de uma dependência econômica de nações ricas.
Conflito internacional e o massacre que veio
Vendo-se ameaçados por aquele paisinho que se tornaria um concorrente de sua influência, sobretudo no Brasil e na Argentina, os ingleses despejaram dinheiro e reforços bélicos. O resultado: um sangrento conflito armado que teria condenado ao Paraguai à pobreza e ao subdesenvolvimento. Fim do sonho sul-americano.
A busca por provas de um complot
‘Onde está qualquer documento que prove que foi a Inglaterra? Não existe um documento oficial, não existe nada que mostre que o governo inglês tinha interesse em fazer uma guerra internacional na região’, diz o historiador Francisco Doratioto, professor aposentado da Universidade de Brasília (UnB). O especialista concedeu entrevista à BBC News Brasil na manhã de terça-feira (10/12).
Uma reescrita da história da guerra
A visão contemporânea que se tem do conflito, deflagrado oficialmente com a declaração de guerra do Paraguai ao Brasil em 13 de dezembro de 1864, véspera da invasão das forças do país vizinho à então província do Mato Grosso, é aquela que foi construída por historiadores como Doratioto depois de minuciosa pesquisa em documentos históricos paraguaios, brasileiros, argentinos, uruguaios e ingleses. Em 2002, o historiador lançou seu mais conhecido livro: Maldita Guerra: Nova História da Guerra do Paraguai, consolidando-se como autoridade no tema. Outros estudiosos que foram reconhecidos pela reescrita da história dessa guerra foram os historiadores Ricardo Salles (1950-2021) e, de forma pioneira, Moniz Bandeira (1935-2017).
O impacto devastador da guerra
A Guerra do Paraguai durou de dezembro de 1864 a março de 1870. De um lado estava a pequena República do Paraguai, com cerca de 400 mil habitantes. De outro, a Tríplice Aliança formada por Brasil, Argentina e Uruguai — juntos, somavam pouco mais de 11 milhões de habitantes. O resultado foi arrasador. Calcula-se que a população paraguaia tenha se reduzido para menos de 190 mil pessoas. ‘90% dos homens morreram’, afirma Doratioto. ‘Do sexo masculino, sobraram apenas idosos e crianças.’
Fonte: © G1 – Globo Mundo
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