Cadernos de prova do Enem com frases de poetisa negra brasileira, com foco na valorização da herança africana, publicado no diário mantido pela prefeitura do Canindé, Rio.
Os cadernos de prova do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) 2024 abriram com as palavras de Carolina Maria de Jesus, uma mulher que superou obstáculos e tornou-se uma das vozes mais poéticas do Brasil. Neta de escravos e filha de mãe analfabeta, Carolina nasceu em Minas Gerais em 1945, mas foi em 1947 que veio para São Paulo, mudando para sempre o curso de sua vida. Ela foi morar na favela do Canindé, que ficava às margens do Rio Tietê, e trabalhava como catadora.
A escola que Carolina frequentou, a Escola Paroquial Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos, no Canindé, não possuía bibliotecas, o que obriga os docentes a usar textos de autores como Carolina Maria de Jesus para explicações, como a necessidade de respeitar a natureza e o trabalho. Em suas obras, ela descreveu seus dias de trabalho nas ruas e o desespero de viver em uma área como Canindé, com problemas como a falta de saneamento básico e a pobreza generalizada. Na prova do Enem 2024, as frases de Carolina foram usadas, destacando a importância do conhecimento e da leitura para o desenvolvimento pessoal e social. Além disso, essas frases foram usadas para avaliar a capacidade de compreender e interpretar textos, como a prova da redação do Enem, que avalia o conhecimento e a capacidade de argumentação dos candidatos.
Carolina Maria de Jesus em 500 caracteres: uma vida marcada pela escrita
Na prova deste domingo, a presença de Carolina Maria de Jesus foi sensacional, com quatro fases da autora inundando os cadernos dos estudantes. As frases deslumbrantes, como ‘Quem inventou a fome são os que comem Lá no interior eu era feliz, tinha paz Percebi que sou poetisa fiquei tristeO arco-íris foge de mim – Quarto de despejo’, eram obras clássicas como Quarto de Despejo e Meu estranho diário, uma coletânea com registros exclusivos do diário mantido pela autora.
Quem era Carolina Maria de Jesus e sua luta pela escrita
Nascida em Sacramento no dia 14 de março de 1914, Carolina Maria de Jesus viveu boa parte da vida na favela do Canindé, em São Paulo. Autora de obras impecáveis da literatura brasileira, a escritora começou a ficar famosa em 1958, quando trechos do diário dela, que trabalhava como catadora de papel, foram publicados pelo extinto jornal ‘A Noite’. Ela tinha cadernos com romances e poemas que começou a escrever na infância, ainda em Sacramento.
Escolha da prova e inspiração para escrever
Carolina Maria de Jesus só estudou dois anos, que foram suficientes para ela criar uma paixão pela escrita. Em sua jornada à São Paulo passou por momentos difíceis, encarando, inclusive, a fome. Dessa experiência e de uma profunda capacidade de observação, ela tirou a inspiração para escrever a sua principal obra: ‘Quarto de Despejo’. A obra foi publicada em 1960.O livro foi um sucesso, com mais de 3 milhões de cópias traduzidas em 16 idiomas e levou Carolina Maria de Jesus a percorrer o país. Multiartista, ela também ganhou visibilidade como cantora, escritora de contos, crônicas, letras de música, peças de teatro e artista têxtil. Carolina Maria de Jesus morreu nos anos 70.
Legado de Carolina Maria de Jesus e disputa da herança
Hoje, sua herança está sendo disputada na Justiça pelas netas e pela filha da autora. A questão racial no Enem foi sensacional, com as frases da autora nos cadernos de prova já trazendo o tom do exame deste ano que teve como tema da redação a valorização da herança africana. Os textos base trouxeram trechos que debatiam a importância do legado dos povos no país, a forma como, ao longo do tempo, sua herança foi sendo colocada no campo do ‘folclore’.
Valorização da herança africana no Enem
Além de um samba enredo da Mangueira, de 2019 que diz: Brasil, meu nego, deixa eu te contar a história que a história não conta. Além da redação, as questões do exame também abordaram a herança africana, racismo, inclusão. Alguns exemplos citados em questões são a abordagem do Axexe, uma cerimônia fúnebre do candomblé.E a discussão sobre o experimento de uma influenciadora negra que, sem conseguir um bom alcance, decidiu postar fotos de pessoas brancas e viu isso aumentar.
Fonte: © G1 – Globo Mundo
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